O dia chega esplendoroso na encosta oeste do lado de cá do fim do mundo. As chuvas de ontem lavaram o ar, o chão, folhas e galhos e tudo resplandece com mais contraste à luz que, aos poucos, a partir do alto das árvores, pinta de amarelo e esquenta, mas já bate em cheio, ilumina e quase ofusca na encosta leste, do outro lado do vale, onde se derrubou a mata para construir estranhos sobrados, coloridos e conspícuos que escorrem como alegoria de favela de luxo. O rádio dá conta de céu nublado em São Paulo. Logo desanuviará, por certo, a confirmar o vento constante e forte que as folhas apontam, de oeste-noroeste para leste-sudeste. Ontem explodiram em cor 28 flores lilases, já duas vezes mencionadas, apesar do tempo de chuva. Apesar do tempo, atraíram as mesmas abelhas pequenas e negras, mas poucas.
Por algum motivo, vêem-se e ouvem-se poucas aves. O arrulhar de uma pomba, das grandes, a que chamam "verdadeira". Pequenas aves, com asas em formato de bumerangue, cortam o ar em vôo rápido. Algumas cigarras ensaiam cantoria e se ouvem, também, grilos. Daturas verde-rosa preparam uma nova florada, que deve abrir à tarde. Uma das flores está mais adiantada, em pouco oferecerá seu perfume adocicado e outros atrativos às abelhas e outros insetos, mas só à noite emanará todo seu odor. Meu pai veria tudo isso e seu 34698º dia, hoje, mas morreu há 5662 dias. Números sem significado. Medem-se vidas em anos, não dias. Se o dividirmos 34698 por 365, dá 95,063. Quer dizer, ele completaria 95 anos, sempre professor de matemática, para explicar que aqueles quebrados indicam os anos bissextos, é óbvio. Outra continha mostra que viveu 29036 dias, que se arredonda para 79 anos e meio. A toda hora se fala em milhões de dólares, bilhões disso ou daquilo... Dias, uns 30 mil, pouco mais, pouco menos. Aproveite bem este. Hoje, nunca mais! |
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