Esta manhã de maio começou branca entre as oscilações de um mormaço incerto. A luz, muito oblíqua e tênue, pintou a paisagem em tons suaves de aquarela, com um fundo feito de azuis muito claros, a se diluírem na brancura das sobras de uma frente fria, responsável, também, pelo ar frio e úmido, parado, de folhas petrificadas. Uma abelha visita cada florzinha cor-de-rosa de uma planta rasteira de folhas grenás. Um sagüi corre, saltitante, por um galho quase horizontal do chico-magro. (Hoje aprendi ser esta árvore a tão falada embira de nossos indígenas. As cascas dos frutos davam a fibra cantada por Gonçalves Dias em I-jucapirama: "Acerva-se a lenha da vasta fogueira / Entesa-se a corda da embira ligeira, /Adorna-se a maça com penas gentis"...) Enquanto isso, guias de multidões nos tolhem já com o aguilhão do voto compulsório, embalado em ideais de liberdade e eqüitabilidade. Propõem a cada um uma escolha com salomônica sabedoria e se lhe nega o discernimento banal para a decisão de votar, ou não. As massas de água suspensas nos ares, essas nuvens tão propensas a se liquefazer, toldam já nossa estrela e a radiação menor sublinha o incômodo do ar úmido e frio. Do meio da vegetação, um grilo insiste em sua guizalhada monótona. Sempre me espanta o poder desse canto em um ser tão pequeno. Quando nos livraremos de todo guia, de todo instrutor, de toda propaganda e catecismo para aprender com o viver e esse dom tão humano do discernimento? Ligo a televisão, ligo o computador e me transformo no personagem do humorista: o da poltrona. Para que pensar, como diz uma amiga, ao afirmar: as pessoas não gostam de pensar. No entanto, quedo perplexo ante a constatação inexorável da inutilidade do pensamento na hora da verdade, nas situações extremas. Aí, a emoção se apossa de nós e desliga o botão da razão. |
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