Voltam a tamborilar sobre as largas folhas plissadas pingos ralos de um chover incerto. A estiagem dos últimos dias, de um sol franco em céu poluído, não nega o ano de abundantes águas, isento da seca típica de outros invernos. Cadê o pó fino e penetrante arrancado em nuvens à terra batida por pneus indóceis? Tudo se enche de reflexos molhados.
Qual aguada de severo pincel oriental, o céu se expande em gradações de claro-escuro, em cinzentos tenebrosos. O dia oscila. Talvez devêssemos medir-lhe a luminosidade. Acendem-se as lâmpadas nos postes. Plantas hesitam em se fazer inverno ou primavera. O liquidâmbar com poucas folhas, algumas ainda por amarelar, brota em botões novas folhas - botões, sim! - botões de folhas nas extremidades dos ramos quase nus, botões de um verde-claro que os faz brilhar.
No ano das chuvas, chove. Ora caem pingos mais grossos a avolumar o rumor, ora pára de gotejar. A luz oscila sem relação aparente com a água que cai. A maria-sem-vergonha, higrômetro natural, viceja com exuberância incomum. De tempos em tempos, uma trovoada zanga. Cães se encolhem, pássaros também.
O jardineiro da escola de tênis apara cercas-vivas, proteções de quadras vazias de gente e cheias de poças. Na abordagem, é direto: que tempinho, hein! - comenta com tom de condenação e logo lembra da véspera ensolarada. Acha um responsável: o desmatamento implacável de uma empresa imobiliária a uns mil metros daqui. No feio cenário da devastação um amontoado de grandes raízes arrancadas por tratores, qual dedos crispados riscavam o azul. O jardineiro explica: sem elas, e aponta a árvores mais perto, não existe vida. Não satisfeito, continua: por exemplo, o deserto do Saara não tem vida, é só areia... Apresso-me. A qualquer momento a chuva pode voltar.
O que em mim depende tanto da luz solar, do azul do ar?
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