É a imperfeição que faz divina nossa mão. Imperfeição, estigma humano demais. É ela, imperfeição, que humaniza uma obra. O produto da máquina goza de uma exatidão que o banaliza. Carece dos erros inevitáveis da mão humana, do gesto que titubeia, do prumo torto de que um olhar é capaz. Tais deslizes - uma simetria errada, a eloqüência de uma proporção absurda ou matizes que refletem a alma mais que o rigor da luz - são tais imprecisões, que tornam a obra humana quase divina. Olhe à roda, é quase tudo obra de máquina. O robô dos sonhos não é o boneco falante a fazer piruetas de feiras e salões, não, ele cresce como organismo por toda parte e em cada canto sentimos e nos sentem suas terminações nervosas - nos olhos e ouvidos de celulares, nos satélites a guiar e espionar, nos terminais de cartões magnéticos, nas esteiras que levam ao avião, na multidão de fios e sinais a ligar por sinapses virtuais tudo a todos, em um monstruoso ser, robô do porvir. Vem a pergunta "me diga se estas fotos são de verdade". De novo, alguém com a velha dúvida - e, com que bela forma ma apresentou desta vez: "são de verdade?" Sim, a sugerir não ser fotografia a imagem em que não se pode acreditar! A antiga idéia de fotografia como prova irrefutável da verdade que retrata. Quem, diante de uma imagem digital, a garante livre de alguma pincelada marota? E pincelada metafórica, herança do tempo dos pincéis. Pincéis capazes de imprimir ao quadro a sagrada imperfeição do gesto humano, a escorregadela que com que o além da razão dá suas pinceladas. Pincel ou "lápis do artista", de Talbot que, na pré-história da Fotografia permitiu prescindir, pela primeira vez, da mão do artista com sua "Arte do Desenho Fotogênico - Processo pelo qual os Objetos Naturais podem se Delinear a si mesmos sem Ajuda do Lápis do Artista". |
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