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O monstro03/02/04Era um monstro feio, de enormes orelhas e com olhos a saltar fora das órbitas. As pernas finas pareciam incapazes de sustentar o corpo disforme, onde predominava a monumental barriga na massa que despencava em sucessivas dobras. O polegar, era bem maior que os demais dedos, se é que havia outros dedos pois, depois de mais de trinta anos, no que me resta do trabalho do ilustrador, de nome parecido com Graham, que vi numa Playboy, em casa de um amigo, não se deve confiar, pelos efeitos e danos inevitáveis do tempo. De todo modo, se propunha o trabalho a ilustrar o homem do século 21 que, então, parecia distante e inatingível. O desenho ilustrava matéria que, com humor e ironia, imaginava como poderia evoluir o "rei da criação", segundo os princípios de Lamarck do uso ou não das partes... Daí o privilégio à audição e à visão - a alta fidelidade e suas variantes estavam no auge e a revista, cheia de fotos de belas mulheres - não lembro a explicação para o grande polegar, me sobra a memória visual. Um detalhe tornava a figura definitivamente horrorosa: testículos imensos! Dessa forma o artista traduzia o eterno culto a uma fanática atividade sexual. Ontem uma amiga, ao responder a mensagem onde mencionei a correspondência indesejável que recebemos, assinalou: "É de enlouquecer a quantidade de lixo que eu recebo também... aliás, se eu tivesse um pênis ele estaria dando a volta ao mundo... ou melhor, iria diretamente, reto, até a lua, tantas as propagandas para aumentá-lo e mantê-lo reto!!!" A ciência há muito descartou a teoria da incorporação, ao patrimônio genético, de caracteres adquiridos, mas minha amiga, sem saber, "corrigiu" com igual humor a obra do exímio ilustrador. E mais: a objetividade feminina disse em palavras diretas e claras o que eu queria dizer, mas não ousei... |
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