maio de 2000 Crônica do dia

[No fim, cada mania acha seu louco.]

O preço do alimento

05/09/07

O casal de bem-te-vis pousou um sobre a luminária pública outro em sua haste e logo emitiram um grito de guerra. Permito-me a leviandade de adjetivar pios de bem-te-vi depois de longa convivência com sucessivas gerações desta ave, que por aqui abunda.

Ao pio enérgico e intimidador, logo se seguiu o ataque: um após outro, os bem-te-vis deram rasantes espetaculares sobre as folhas mais extremas da paineira, tenras e translúcidas, pois ainda não acabaram de crescer. Ali, entre esses galhos mais flexíveis, vi o sagüi. Ele, sob ataques que se repetiam, subiu pelos galhos espinhentos da majestosa árvore sem parecer se incomodar com os espinhos, capazes de impedir um homem de galgar tais galhos. Foi rápido como guepardo na campina. As aves, em vôos de muita perícia por entre os ramos, continuavam a ameaçar e, ao passar bem perto do animal, soltavam seu grito de guerra. Não tentavam atingi-lo com bico ou garras. Ele, o sagüi, parecia saber muito bem o que queria e subia sempre, rumo ao topo da grande árvore, a uns dez metros do chão.

Então, vi o outro, a observar tudo lá do alto e, logo depois, o terceiro. Juntos, foram ao que queriam, um ninho, não o dos bem-te-vis, outro, numa forquilha do galho mais alto. Atacaram vindos de três direções mas, cada vez que um deles se aproximava mais, um vulto - estava tudo contraluz, eu olhava de baixo! - abria asas e se tornava imenso. Eles recuavam. Fosse quem fosse, não arredava do ninho onde, provavelmente, chocava.

O primeiro desistiu. Os bem-te-vis, não. Desceu e encontrou um meio de pular para uma jovem palmeira. O cachorro, o vendo tão perto, começou a ameaçá-lo com latidos. Um a um os outros percorreram a mesma rota de escape, sempre sob as ameaças do cão, até chegarem ao abacateiro.

Os bem-te-vis sossegaram. Eu fui fritar um ovo para o café-da-manhã.

 

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