Passageiros

10/08/12

Mudamos nossos meios de comunicação, extensões nossas como quis McLuhan e, como ele previu, os novos meios nos mudam e continuam a nos mudar. No ônibus ou no metrô, constato em estatística pessoal: um terço dos passageiros - somos todos passageiros, da nave Terra, satélite solar e de efêmera passagem por uma vida que vai acabar! - um terço dos passageiros têm fios pendurados nas orelhas a lhes entrarem por dobras das roupas e bolsos. Outro tanto viaja com os olhos pregados nas pequenas telas de seus telefones, espertos ou não, os telefones, é claro, smartphones dessa nova língua híbrida, também ela, das extensões propiciadas pela tecnologia galopante.

Aos dezessete anos, ouvi da costureira que acumulava o cargo de telefonista da, então, insignificante Itatiaia, município assinalado pelo Dedo de Deus, ser de cinco horas a previsão de espera para completar uma ligação para a capital do estado, o Rio, ainda capital, também, do país. Cinco horas, e o Rio ali, a menos de 200 quilômetros! Agora, ouço segredos de transeuntes que, para serem ouvidos por um interlocutor que desconheço, compartilham comigo metade de uma conversa que não me diz respeito e que preferiria não ouvir.

A intimidade, a privacidade e até o recato tornam-se assim ameaçados pelos novos meios de comunicação e de entretenimento. Sim, ampliamos da mesma forma tais meios, de entretenimento, ou seja, de distração. Talvez por ser difícil estar consigo, perceber-se e, para adiar este encontro, abraçamos o primeiro entretenimento disponível correndo o risco de transformar a vida numa fuga permanente de si mesmo.

O chofer - também ele mudou:agora é motorista! - tentava, além de dirigir, escrever alguma coisa no teclado de sue telefone esperto, mas a distração o entreteve tanto que se foi como passageiro desta vida.

Fri, Aug 10, 2012 9:19 am

Oi Clode

É mesmo impressionante a velocidade que os "meios de distração" estão evoluindo..... eu não dou conta de acompanhar, já estou "atrasada" em muitos aspectos! :-) Eu era razoavelmente boa em datilografia, mas detesto o miniteclado do celular para enviar mensagens escritas, por exemplo.... sem chance!!

Minha tia era telefonista e, nas férias e feriados eu ía muitas vezes trabalhar com ela nos plantões, eu acompanhava o troca-troca dos fios, era mágico acompanhar as conversas viajando e se conectando, até o destino final das duas vozes - que a gente escutava... (segredo!!)

Você consegue vislumbrar como será daqui a 10 anos??

beijo
Aida

Não, claro que não! Seria idiota fazer qualquer previsão. Tudo que posso prever é que 2022 será chamado de três patinhos na lagoa... ou nem isto. Quanto ao teclado do celular sou incapaz até de atender uma chamada sem esbarrar na tecla ao lado. Aliás, mesmo neste teclado do 'desktop', à toda hora isto aconte4ce...

O posto telefônico daquela Itatiaia era na sala de visitas da casa da telefonista. Ali, além de uma máquina de costura 'Singer', havia, preso à parede, um telefone de manivela, com um bocal fixo e protuberante e um grande apêndice auditivo preso a um fio. Ela girava a manivela e pedia a ligação a outra telefonista... Conte já esta história em uma crônica antiga.

Por fim, criança ainda, fui fascinado pelas mesas telefônicas com uma infinidade de furos e vários pinos em pontas de fios para permitir ligar cada Maria ao seu João...


Sat, Aug 11, 2012 10:28 am

m a r a v i l h o s o !!!!!!!    o passageiro  foi final  surpreendente!!!!

Renato Imbroisi

Obrigado.

(Alguns elogios elogiam muito mais...)


Sat, Aug 11, 2012 3:44 pm

esse eu vou imprimir e guardar, não vou aguardar a publicação do seu livro
ainda tenho essa fantasia q a gente vai conseguir publicar um livro com as croniquins ...

muito lindo, profundo, poético, real e irreal ...

bjs carinhosos, Maren

E não somos todos passageiros, fora o trocador e o motorneiro?

|home| |índice das crônicas| |mail|  |anterior|

2456149.90981.1157