Sumaia era dois anos mais velha que Rafic. Ora, direis, dois anos, que são? Nada, se no horizonte não se esboça, ainda que baço, o fim do caminho. Tempo incomensurável quando, uma após outra, pétalas se desdobram em flor. Sumaia era baixa, magrela, de cabeleira farta e negra, nigérrima. Cabelos de mechas encaracoladas, abundantes a lhe devorar com volúpia o rosto e o delinear afilado para um queixo forte, encimado por boca reta e sobrancelhas espessas e negras como os cabelos. À Sumaia, aliás, não faltavam pêlos. Ocorreu que Sumaia se viu tomada de sentimento arrebatador a lhe impulsionar para Rafic, alto, mais moço, desligado ou que, pelo menos, não parecia a ter notado ainda. É difícil decifrar e distinguir cada sentimento ao nos deparamos com ele pela primeira vez, mas à mulher é intuitivo saber se fazer notar e mais, fazer-se atraente. À Sumaia provocante Rafic não pôs obstáculo, malgrado outro foco lhe arrebatasse então. Mas tudo lhe parecia normal e o que o consumia, deixava espaço a eventual namorada, passageira, como a moça faceira do Rum Creosotado. Da verdadeira amada, nem o nome ousaria, sequer em sonhos, pronunciar.
A outra, alta, loura, lhe parecia - e a todos, pela altivez - parecia flutuar acima dos demais, mas era bonita, linda demais, morava no bairro mais chique e Rafic a tinha em sonhos inconfessáveis, eleito dona de seu coração. Coração? Devia ser, em tempo de tantas descobertas aquela jazia muda, mas com Sumaia, afloravam outras e tão surpreendentes que, no roldão da multidão de sensações, os dois fechavam olhos e se deixavam ir ao sabor do novo, das mãos dadas, de pêlos arrepiados, de cheiros inesperados, aturdidos, embriagados pelas primaveras que se faziam estação e se faziam neles. Perdiam-se um no outro enquanto a deusa, sempre deslumbrante e desejada por todos, Rafic esquecia. |
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