Príncipe


13/09/97

Mais um pouco e esquecerão Di. Hoje, ainda, nem mesmo a mulher ou as mulatas do pintor, se vivas, achariam que falo dele, que é di mesmo, como o di de diabo. Hoje, as duas letrinhas tem som estrangeiro, viraram dai, como nosso verbo quase esquecido: dai a Cézar o que é de Cézar... As emoções coletivas são efêmeras como tudo que é vivo. Nascem e logo morrem, precisam ser substituídas. Como folhas, a cada primavera. Jornalistas e marqueteiros, amiúde se imaginam no comando dessas substituições, regentes das estações. Mas jornalistas e marqueteiros, além de jornalistas e marqueteiros, são gente também. Chupam com mais avidez que simples mortais o chimarrão da mídia e não dão sinais de estarem vacinados contra a própria saliva... Mais um pouco e a princesa símbolo de todas as princesas de contos de fada será esquecida, levando consigo a madre Tereza, que virou pauta de comparação.

Ah, as princesas de contos de fadas são imortais! Se morrem sem pedir licença e sem qualquer possibilidade de algum encantamento para trazê-las de volta à vida, mesmo que após o sono de um século, é terrível! Se morrem prematuramente, pior ainda. Nossa efemeridade se reflete na morte da princesa. Como se, de repente, a vida nos mostrasse com nitidez, que somos simples mortais, que é impossível adivinhar o túneis de nosso percurso...

Devo confessar que falava de princesas e pensava no príncipe. Não naquele, cujo nome nem lembro, e que é literalmente um príncipe para inglês ver. Tentava imaginar quem seria o príncipe dos sonhos e contos de fadas, ainda que temporariamente sob o aspecto de mero batráquio. Faltam príncipes! Já notaram como faltam Príncipes?

Quando menino e, ao dizê-lo, paro, para certificar-me de que não minto... mas creio que era eu mesmo, - quando menino, o Príncipe era uma coisa mágica, até nas mãos dos marqueteiros. Lembro que havia uma loja, no Rio, com este nome: Príncipe. Vendia roupas para crianças e rapazes. Pode ser que ainda exista, não sei . O que importa era um pequeno anúncio/programa, no rádio, patrocinado pela tal loja. Ia ao ar num horário que, hoje se diria nobre, e repetia, dia após dia, uma mesma canção. Tem razão, dona Sabrina, toda razão. Devia ser um saco, para os adultos ouvir todos os dias, ou melhor, todas as noites, aqueles cinco minutos sempre iguais. Para um menino, no entanto, era fascinante, pois mantinha acesa o ano inteiro, a magia do dia do aniversário.

A loja prestava uma homenagem aos aniversariantes do dia. Explicava que quem faz anos é sempre um príncipe e, por isso, Príncipe, a loja, trazia aquela homenagem e coisa e tal. Aí tocava a canção, cujas palavras diziam mais ou menos a mesma coisa. E para os meninos e meninas, o mundo parecia cheio de príncipes todos os dias. E muitos estariam comemorando seus aniversários naquele dia...

Agora, morre a Princesa, e seu enterro tem uma platéia maior do que a que viu o homem pisar na Lua. As bruxas ecoam seu grunhidos e a amiga me conta que elas, na chuva, preferem o rodo, para viajar... Olho em volta e não consigo perceber príncipe algum. Cadê os príncipes? Príncipes de verdade, como dizia a canção da loja carioca? Hoje em dia, até mesmo sapo está difícil de encontrar. Coitada da princesa aventureira que quiser arriscar um beijo...

Hoje mulher é tratada no tapa, e não vou discutir, aqui, as teorias ou simples frases do Príncipe dos Cronistas, sobre o que a mulher gosta, ou deixa de gostar. Foi-se o tempo em que, no ônibus cheio, o homem cedia, rápido, seu lugar à mulher. Foi-se o tempo em que o homem corria a abrir a porta do carro, do elevador, da casa - qualquer uma e esperava a mulher entrar, ou passar. Foi-se o tempo em que o homem puxava a cadeira, no restaurante, para ajudar a mulher a sentar ou segurava seu casaco para ajudá-la a vestir ou, ainda, simplesmente, pedia seus pacotes, para carregar...

Ontem foi o aniversário de um amigo, quer dizer - até ontem, um grande amigo. Talvez não queira mais me ver, pois não apareci em sua mega festança, Queria cantar para ele que "quem faz anos é sempre um príncipe, príncipe de verdade,/quem faz anos é sempre um príncipe/pode reinar à vontade..." como na velha canção. Ele pode, então, mandar decapitar seu súdito, como a Rainha de Copas, de Alice: - "cortem-lhe a cabeça".



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