Mais um pouco e esquecerão Di. Hoje, ainda, nem mesmo a
mulher ou as mulatas do pintor, se vivas, achariam que falo dele,
que é di mesmo, como o di de diabo. Hoje, as duas letrinhas
tem som estrangeiro, viraram dai, como nosso verbo quase esquecido:
dai a Cézar o que é de Cézar... As emoções
coletivas são efêmeras como tudo que é vivo.
Nascem e logo morrem, precisam ser substituídas. Como folhas,
a cada primavera. Jornalistas e marqueteiros, amiúde se
imaginam no comando dessas substituições, regentes
das estações. Mas jornalistas e marqueteiros, além
de jornalistas e marqueteiros, são gente também.
Chupam com mais avidez que simples mortais o chimarrão
da mídia e não dão sinais de estarem vacinados
contra a própria saliva... Mais um pouco e a princesa símbolo
de todas as princesas de contos de fada será esquecida,
levando consigo a madre Tereza, que virou pauta de comparação.
Ah, as princesas de contos de fadas são imortais! Se morrem
sem pedir licença e sem qualquer possibilidade de algum
encantamento para trazê-las de volta à vida, mesmo
que após o sono de um século, é terrível!
Se morrem prematuramente, pior ainda. Nossa efemeridade se reflete
na morte da princesa. Como se, de repente, a vida nos mostrasse
com nitidez, que somos simples mortais, que é impossível
adivinhar o túneis de nosso percurso...
Devo confessar que falava de princesas e pensava no príncipe.
Não naquele, cujo nome nem lembro, e que é literalmente
um príncipe para inglês ver. Tentava imaginar quem
seria o príncipe dos sonhos e contos de fadas, ainda que
temporariamente sob o aspecto de mero batráquio. Faltam
príncipes! Já notaram como faltam Príncipes?
Quando menino e, ao dizê-lo, paro, para certificar-me de
que não minto... mas creio que era eu mesmo, - quando menino,
o Príncipe era uma coisa mágica, até nas
mãos dos marqueteiros. Lembro que havia uma loja, no Rio,
com este nome: Príncipe. Vendia roupas para crianças
e rapazes. Pode ser que ainda exista, não sei . O que importa
era um pequeno anúncio/programa, no rádio, patrocinado
pela tal loja. Ia ao ar num horário que, hoje se diria
nobre, e repetia, dia após dia, uma mesma canção.
Tem razão, dona Sabrina, toda razão. Devia ser um
saco, para os adultos ouvir todos os dias, ou melhor, todas as
noites, aqueles cinco minutos sempre iguais. Para um menino, no
entanto, era fascinante, pois mantinha acesa o ano inteiro, a
magia do dia do aniversário.
A loja prestava uma homenagem aos aniversariantes do dia. Explicava
que quem faz anos é sempre um príncipe e, por isso,
Príncipe, a loja, trazia aquela homenagem e coisa e tal.
Aí tocava a canção, cujas palavras diziam
mais ou menos a mesma coisa. E para os meninos e meninas, o mundo
parecia cheio de príncipes todos os dias. E muitos estariam
comemorando seus aniversários naquele dia...
Agora, morre a Princesa, e seu enterro tem uma platéia
maior do que a que viu o homem pisar na Lua. As bruxas ecoam seu
grunhidos e a amiga me conta que elas, na chuva, preferem o rodo,
para viajar... Olho em volta e não consigo perceber príncipe
algum. Cadê os príncipes? Príncipes de verdade,
como dizia a canção da loja carioca? Hoje em dia,
até mesmo sapo está difícil de encontrar.
Coitada da princesa aventureira que quiser arriscar um beijo...
Hoje mulher é tratada no tapa, e não vou discutir,
aqui, as teorias ou simples frases do Príncipe dos Cronistas,
sobre o que a mulher gosta, ou deixa de gostar. Foi-se o tempo
em que, no ônibus cheio, o homem cedia, rápido, seu
lugar à mulher. Foi-se o tempo em que o homem corria a
abrir a porta do carro, do elevador, da casa - qualquer uma e
esperava a mulher entrar, ou passar. Foi-se o tempo em que o homem
puxava a cadeira, no restaurante, para ajudar a mulher a sentar
ou segurava seu casaco para ajudá-la a vestir ou, ainda,
simplesmente, pedia seus pacotes, para carregar...
Ontem foi o aniversário de um amigo, quer dizer - até
ontem, um grande amigo. Talvez não queira mais me ver,
pois não apareci em sua mega festança, Queria cantar
para ele que "quem faz anos é sempre um príncipe,
príncipe de verdade,/quem faz anos é sempre um príncipe/pode
reinar à vontade..." como na velha canção.
Ele pode, então, mandar decapitar seu súdito, como
a Rainha de Copas, de Alice: - "cortem-lhe a cabeça".
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