O metrô chega à estação e da aglomeração diante da porta, sentia-se, pelo rilhar de trilhos e rodas a desaceleração do trem. Concluí a conversa ao dizer inúteis as leis e possível uma sociedade de paz, somente quando todos fossem bons. A senhora idosa, baixinha, a nossa frente não resistiu e se virou para confirmar com olhar perscrutador e sorridente sua anuência. Momentos de anonimato e comunhão como este marcam. Partilha-se humanidade, um pouco do imponderável a nos fazer, a todos, irmãos em espécie (como classificação biológica). Seja com um sorriso furtivo, um olhar velocíssimo cheio de significado, um gesto involuntário e peremptório ou um convite mudo na expressão do rosto, trocamos interações sutis como ainda desconhecidos que somos na multidão. O poder de comunicação do rosto humano é fabuloso, familiar e, por isto, quase nunca o percebemos. Em 'O que é Fotografia', escrevi: "O sofisticado código de sinais faciais, que deve ter-se aperfeiçoado muito antes da fala, é utilizado com tal automatismo e é tão universal que quase nunca sequer nos damos conta de sua existência!" Adiante, contava a história de uma fotografia: "Em agosto de 1974, o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, renuncia, sucumbindo ao chamado 'escândalo de Watergate'. Gerald Ford, há pouco designado vice-presidente, assume a Casa Branca. Por todo o mundo, nas embaixadas, consulados e repartições norte-americanas segue-se um ritual silencioso e significativo, registrado em Bonn, na embaixada, pela objetiva de Peter Mitchell: o retrato do novo presidente é içado às paredes, enquanto o de Nixon, carregado por um guarda circunspeto, é levado, provavelmente para os porões."
Ontem, a cena se repetiu, 35 anos depois, com os atores deste tempo e em cenário mais significativo, que remete a tempos mais remotos... |
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