A crônica de ontem me fez lembrar de quando aprendi a andar de bicicleta. Depois de a publicar, me veio à memória, ainda nítida, quase sessenta anos depois. Algo adormecido por tanto tempo no emaranhado de sinapses e alucinações faz da lembrança alvo de interesse em si. Disseram-me que aprendi a andar de bicicleta aos cinco anos. Posso estar enganado, mas visualizo bem a praça principal - haveria outras? - de Nova Friburgo, palco do aprendizado. Praça cortada, numa lateral, por trilhos de trem, da maria-fumaça que nos trazia serra acima a partir da Leopoldina. A linha seguia até Cataguases, em Minas ou mais. Uma grande perda visual e emocional o fim dos trens a vapor! Vasculho, e a memória distante me parece um feixe de informações incompletas, peças de um mosaico sem limites a se espalhar em todas as direções. A praça, imensa para a criança, se estendia na direção dos trilhos. Eles, e não uma capela, eram o centro daquele espaço, sua espinha dorsal. Acho que o trem já não passava mais por ali, parava na estação da cidade serrana, um pouco antes... As reticências, aqui, ocultam novos detalhes, pois memória atiça memória... Da praça, recordo os eucaliptos imensos a encher, no tempo de férias, o chão de pequenos sininhos - cápsulas de semente? Levávamos muitos para casa, para a 'Chácara dos Netos' e, lá, brincávamos como se fossem minúsculos piões a girar sobre o cabo... Tudo mais na praça se esbateu na lembrança e se me disserem que era assim ou assado, responderei: pode ser... Talvez houvesse um coreto. Brinquedos para crianças? Certo, para mim, foi quando percebi meu engano e descobri que a menina que segurava o selim, para me ensinar a andar de bicicleta, já não estava mais ali, ficara lá atrás, longe... Pedalava tranqüilo certo dela a meu lado, na corrida à guisa de rodinha. |
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