Era uma vez um menino que gostava de ver meninas se banharem nos rios de uma terra empoeirada onde rio era coisa rara. Depois, ele virou rei e ainda gostava de apreciar o banho das meninas. Davi, o rei, um dia espiou "uma mulher que se lavava ali defronte dos terraços de seu palácio" e gostou demais do que viu, tal formosura lhe atribuem os tradutores, que o rei mandou saber quem era. Ora, como não existia ainda novela das oito, mandaram dizer que era a mulher do melhor dos generais dos exércitos do rei e mais, grande amigo de Davi, Urias, o heteu. O rei mandou "mensageiros e fez que lha trouxessem; e tendo entrado Betsabéia," - eis o nome da futura esposa do rei e mãe de Salomão - "dormiu com ela; e ela purificou-se logo da sua imundície; e voltou ela para sua casa, tendo concebido. E mandou dizer a Davi: concebi." A mim não cabe repetir a história famosa, pois se a pego emprestada é só para assinalar, como sempre, o quanto o ser humano é bicho visual. Claro, águia, sapo, pavão e muitos outros seres devem depender demais de seus olhos e, para certas coisas, até mais do que nós. Mas dificilmente existirá outro bicho que dedique mais tempo de sua existência a preparação e execução do exibir-se e observar-se, como parte da corte. Foi a natureza que designou que os meninos se sentissem atraídos e achassem graça no banho das meninas tanto quanto as meninas achassem estimulante se saberem observadas por um ou mais meninos, durante o banho, assim como os rios em terras empoeiradas enquanto correrem descerão. Talvez houvesse menos tensão no mundo se todos os maridos compreendessem que à mulher cabe ser bela e se enfeitar e se perfumar e se exibir e provocar. E se todas as mulheres compreendessem que ao homem cumpre olhar, medir e admirar toda bela mulher. |
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