Aquarela do autor

de esporadicidade imprevisível

As fake news

31/10/18

Quando cheguei em São Paulo, em meados dos anos sessenta, ouvi antes de viajar recomendações dos colegas, todos cariocas como eu, para não confiar em informações dadas por paulistas, ávidos por se divertir às custas de um carioca. Exemplificaram com uma suposta indicação de direção: "se disserem para tomar a esquerda, deve ser porque o sentido certo a seguir é à direita".

Logo constatei, na pauliceia de Mário de Andrade, muita cortesia e uma preocupação em fornecer instruções corretas e cheias de minúcias para indicar como se deslocar na cidade gigante sem a referência tão marcante, no Rio, da montanha e do mar.

No aviso dos amigos cariocas, entretanto, jazia a semente da fofoca, da maledicência e da informação intencionalmente errada com objetivo de dela obter algum proveito. Naquele caso, apenas umas risadas ou pouco mais, a alimentar uma pretensa disputa entre cariocas e paulistanos. Eram inofensivas fake news muito distantes dos atuais meios tecnológicos adequados a amplificar suas consequências.

Nós, seres humanos, sempre utilizamos o poder da palava e da mentira para obter vantagens, desde quando Caim, respondeu ao Senhor "Não sei! Sou porventura eu o guarda do meu irmão?", após matar Abel. Continuamos o mesmo Homo verbalis a valorizar mais as palavras do que os fatos e, assim, possibilitar à mentira florescer e frutificar.

Não nos tornamos mais fofoqueiros, mais maldizentes. Apenas dispomos, agora, de poderosos recursos de difusão para propagar nossas mentiras intencionais, para fofocar, maldizer, fuxicar e mexericar.

As fake news estão com tamanha evidência, assustam, amedrontam e preocupam tantas pessoas, por sermos passíveis de sua influência, por sermos vulneráveis ao seu conteúdo falso e isto porque nós atribuímos à palavra uma importância maior do que ao que é.

Wed, 31 Oct 2018 11:55:54 -0700 (PDT)

muito interessante a observacao de que sempre mentimos e de que sempre houve fake news

      sem assinatura

Que bom que você concorda!

Não é mesmo, mudaram as condições de divulgação. Já na história de Drácula, de Bram Stoker, a rainha se suicida por causa de uma notícia falsa da morte de seu marido, e o livro foi lançado ainda no séculoIXX. Naquele caso, a fake new veio a cavalo.


Sun, 04 Nov 2018 16:28:44 -0200

Só li hoje, gostei muito e me impressionam duas coisas: você equiparar fofoca à tal da fake news, talvez por eu estar "com medo", como você menciona; estamos mesmo assustados com o poder da mentira travestida de verdade; e você conhecer tão bem as escrituras cristãs. Tem certeza de que você é ateu mesmo?
Beijos

      sem assinatura

Nunca me declarei ateu!

Deus pode ser muitas coisas e não tenho como negá-lo nem afirmá-lo.

Gosto de ler e li os primeiros livros da Bíblia com muito gosto.

Como disse na crônica, mudaram as facilidades de difusão das mentiras (ou fofocas, ou maledicências, ou difamação, ou mexericos etc.) O mentiroso pouco fez para se modificar.

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