detalhe de foto de  1966Crônica do dia

No fim, cada mania acha seu louco.

Uma pilha de tijolos

28/01/08

Estranho ninho! Não, não tinha um estranho no ninho, o ninho, em si, era estranho. Estava caído sob a copa da velha paineira, que se estende por uns seis ou sete metros em cada direção, sob um mundo onde acontece tanta coisa, pulsa tanta vida, que mal se consegue cogitar.

Tecido como a maioria dos ninhos de fibras vegetais, naquele, no entanto, elas pareciam mais finas, menos flexíveis. Olhando de novo, se viam serem finas hastes de capim, destas que, por aqui, em disputa com outros matos, cresce a mais de metro e meio. Eram, sem dúvida, as finas e rígidas hastes do tal capim, sustentáculos das inflorescências precursoras das espigas de sementes.

A primeira vista, o ninho parecia uma bola, uma esfera de fibras secas, com algumas espetadas em todas as direções. Depois se percebia uma forma geométrica, a sugerir um tetraedro com suas seis arestas encurvadas. Examinando-se mais, o sólido aparecia como invólucro de outra estrutura, mais bem acabada, esta sim, esférica e, por alguma razão, mais escura.

O mistério, no entanto, estava na inexistência de uma abertura. Como é possível um ninho sem porta? Aí, percebi uma anomalia na forma, uma espécie de topete, perto de um dos vértices do tetraedro. Com o indicador, achei a abertura, muito bem acabada de antes da queda quando, deve ter batido com aquele vértice no chão e, por isto, perdido sua entrada.

Ninhos duram o tempo da ninhada. Quando os filhotes partem nos primeiros vôos, o ninho abandonado se arruína. Já o sabia por acompanhar os bem-te-vis que, ano após ano, refazem um novo ninho sobre o antigo, num estranho edifício entre os tubos e o corpo do transformador.

"Uma casa não passa de uma pilha de tijolos" - disse o amigo há mais de uma década. Não lembro do contexto ou da conversa quando se saiu com essa: Que é uma casa? No fundo, não passa de uma pilha de tijolos.

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