"Cry me a river" - o verso e título da canção norte-americana certamente continuaria forte e belo se traduzido para qualquer idioma. Chorar um rio não são poucas e fáceis lágrimas, mas um caudal amazônico a manifestar grande sentimento, sincera, profunda e franca comoção.
Voltou-me à memória o verso da canção antiga ao ouvir a descrição da manifestação coletiva de pesar do povo norte-coreano no cortejo fúnebre do tirano recém-falecido. Às vezes uma boa descrição vale mil imagens (pouco mais de 30 segundos de vídeo). E da imaginação das pessoas puxando-se os cabelos, atirando-se ao chão, chorando rios e cachoeiras pelo déspota celebrado, passei ao cimento da emoção que contagia e une multidões.
Uma coisa evoca outra e esta uma terceira amplificando as asas da imaginação. Provavelmente, mesmo quem detestava o ditador se viu contagiado pela soma das emoções de tantas pessoas criando a aflição coletiva capaz de induzir inevitável reação empática. A par da empatia inevitável que amalgama a multidão, talvez exista uma atração pelo simples compartilhar de emoções.
Vem-me logo a imagem das torcidas esportivas, dos aglomerados uníssonos em estádios, teatros, arenas e até salas de cinema. Sentir junto parece ser uma necessidade para o ser humano como, para a abelha, é imperativo colher pólen e néctar, zelar pelas larvas e pela rainha, cuidar da colmeia, fazer mel.
As contagiantes emoções coletivas são poderosas e podem explicar do estouro da boiada ao desespero e lamentação pelo fim de quem nos tiranizava. Chorar um rio, na canção, fala de encontros e desencontros amorosos, tema quase absoluto do cancioneiro popular. No enterro do ditador norte-coreano deveria correr um rio de lágrimas de um povo humilhado.
Uma coisa evoca outra e, de evocação em evocação, um rio nos leva ao ponto final.
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