Velhice
12/04/17
Posso falar da juventude alheia, a minha só percebo através do filtro turvo da memória de um velho. Nítida é-me a velhice, com o que tem de bom e de ruim. É ela o aqui e agora de um velho a envelhecer. É ela a etapa seguinte a tudo que passou, real como foi cada degrau antes galgado. Nem mais, nem menos admirável como vida a se prolongar até a extinção. Acompanhei com desvelo a velhice e a morte de algumas plantas e de inúmeras partes decíduas de outros vegetais. Vi também a vida de animais e gente terminar. Aprendi a ver a morte como o fim natural do viver e não como uma ameaça ao indivíduo ou algum tipo de castigo. "Até a idade de setenta e cinco anos, não detestei a velhice. Encontrava nela inclusive um certo contentamento, uma tranquilidade nova e apreciava, como um alívio, o desaparecimento do desejo sexual e de todos os outros desejos." - assinalou Luis Buñuel em seu "Último Suspiro", apontando uma das coisas boas da velhice. Concordo com o cineasta surrealista: desejos nos escravizam e provocam obnubilação. O desaparecimento de todo desejo traz, sim, uma nova tranquilidade e sensação de alívio. O "bruto querer" nos atormenta e, saciado, se torna anseio por mais ou frustração. O desaparecimento dos desejos - tão exuberantes na juventude - se devem certamente a diminuição de hormônios e outros estimulantes corporais sobre nosso cérebro e sua constatação na velhice modifica, também, a percepção que temos de nós mesmos, a perspectiva de nossos motivos e razões, dos arroubos e rompantes tão comuns na juventude. Contemplamos do novo ponto de vista a possibilidade de um jovem sem o ímpeto e a presunção dos verdes anos, possuidor, todavia da maquinaria impecável dos corpos tenros e com vontade de tudo conquistar... mas, cai a ficha: tal vontade é aquele desejo abolido pela velhice. |
Wed, 12 Apr 2017 11:12:35 -0300 Adorei! Ana, |
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