Papel de alumínio
07/11/16
Atravessei a larga praça sob sol inclemente e sentei-me meio perdido a uma das pequenas mesas de um café. Pedi café e água com gás, enquanto se atropelavam em mim imagens desconexas. Apenas o sentar-me ali em plena tarde evocava inexoravelmente duas personagens. A primeira, Luis Buñuel, frequentador, nas tardes parisienses do início do século passado, de cafés e bares para ali praticar seus devaneios regados a dry martinis e Fernando Pessoa, igualmente, habitué de cafés lisboetas, onde acompanhava o bebericar com muita poesia e fina filosofia. "Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho, / Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida." A tecnologia inova todos os dias, mas nós permanecemos os mesmos há milênios e, embora o papel prateado seja hoje de alumínio em vez de estanho, continuamos a deitar tudo por terra com nosso jeito de pensar. Ah, a verdade da pequena a comer chocolates! E, em meio a tais evocações, avultam-se indagações sobre os limiares entre o real e o imaginário, contrapõem-se os universos das ideias e o dos fatos. Um pombo se aventura entre as mesas. Obtém assim as proverbiais migalhas dos lautos banquetes. Parece jovem e algumas de suas penas têm um brilho irisado. Aparentemente, não filosofa, atém-se a busca de alimento e, quando há ocasião, procriar. Belisco o café, está quente demais para meu gosto. Imagino Serena porta adentro, irrompendo da intensa luz exterior para mergulhar na penumbra enfumaçada do pequeno café: já não é mais metade peixe, caminha com os próprios pés. Serena, uma serena mulher... – Sim, senhor - diz o garçom, pois o chamara com um gesto. A realidade era a água, o café, o garçom e o chocolate a pedir, para saber se não há mesmo "mais metafísica no mundo senão chocolates". Logo estaria às voltas com o papel de alumínio. Quiçá continuará... |
Mon, 7 Nov 2016 12:53:29 -0200 Preciosos poéticos devaneios que nos levam à tarde ensolarada carioca, a Lisboa, a Paris. sem assinatura Como dizia uma amiga, citando "o esquartejador", vamos por partes: Tue, 8 Nov 2016 19:28:24 -0800 (PST) a Serena agora anda? sem assinatura Nos sonhos a coisa acontecem sem explicações. Thu, 10 Nov 2016 18:01:30 -0200 ... uma graça essa história de você flanado pela sua praia carioca... sem assinatura A ver... será que os outros também estão a gostar? |
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