Véspera de solstício. Domingo, vinte horas pelo horário de verão. Aqui, o céu ainda claro tinge por um momento a paisagem com uma luz alaranjada, vinda do nordeste, de nuvens rosadas, apesar da cor laranja da luz. É tempo de sol a pino neste trópico da Capricórnio e, pelas convenções do Homem, amanhã, no fim do dia, principia o verão deste lado do equador enquanto do lado de lá se inaugura o inverno, apesar do frio e da neve já atormentarem há algum tempo os povos do norte. Ao fundo, neste anoitecer, um bando de cigarras tentam um uníssono sem sucesso. Sabiás e outros pássaros também proclamam suas vozes. Por aqui o domingo foi espetacular, depois de uma semana sem sol, sem azul e cheia de chuva e vento a provocar inundações e queda de árvores. As notícias do hemisfério norte me remetem a uma cena da infância: minha avó costumava rezar frequentemente pelo fim do "flagelo da seca no Nordeste". Flagelado era, então, adjetivo associado quase sempre ao nordestino, quase sinônimo. A seca pairava como assombração sobre aquela região. Agora, diante das notícias da neve e do frio me pergunto se seria pior a falta de chuva ou excessos de um inverno que só começa amanhã. Pior padecer de frio ou de sede?Como corolário me ocorre lembrar do aquecimento global tão propagandeado. Nesta véspera, o céu, azul como ontem, embora pálido, distante do intenso azul tantas vezes mencionado aqui e aqui e aqui e aqui e capaz, também ele, de remeter à infância e a lembrança perturbadora de uma espécie de felicidade sob um céu imaculado, azul de doer. Aqui, deste lado do fim do mundo, esta véspera de solstício está cheia de sol e a temperatura sobe e subirá mais. Em junho, será a vez da outra metade da bola e nós lamentaremos por não ir mais depressa a Terra em sua órbita e continuar, em média, a dez mil e poucos quilômetros por hora. |
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